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CNJ apresenta relatório final sobre reconhecimento de pessoas e prisões ilegais Associação Data Privacy Brasil contribuiu com dados e artigo científico sobre proteção de dados pessoais e procedimentos em sede policial

 CNJ apresenta relatório final sobre reconhecimento de pessoas e prisões ilegais Associação Data Privacy Brasil contribuiu com dados e artigo científico sobre proteção de dados pessoais e procedimentos em sede policial

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) apresentou, em 6 de dezembro de 2022, o relatório final do Grupo de Trabalho Reconhecimento de Pessoas, instituído de forma a analisar o reconhecimento pessoal em processos criminais e a sua aplicação no âmbito do Poder Judiciário para evitar a condenação de pessoas inocentes. Segundo dados da Defensoria Pública do Rio de Janeiro e Conselho Nacional das Defensoras e Defensores Públicos-Gerais (Condege), mais de 80% das condenações por erro de reconhecimento pessoal eram de pessoas negras a partir do uso de fotografias como forma de identificar potenciais suspeitos.

A Associação Data Privacy Brasil colaborou com o Comitê Técnico nº 2 fornecendo dados coletados no projeto Novas Fronteiras dos Direitos Digitais, que buscou identificar o ciclo de vida dos dados no campo da investigação criminal e segurança pública, especialmente no que tange aos casos de prisões por reconhecimento fotográfico. Em 2021, foi lançada uma videorreportagem demonstrando como o reconhecimento fotográfico e tratamento de dados pessoais perpetuam injustiças no Brasil.

Além disso, Rafael Zanatta, Pedro Saliba e Gabriela Vergili tiveram um artigo aprovado e publicado na coletânea “Reflexões sobre o reconhecimento de pessoas: caminhos para o aprimoramento do sistema de justiça criminal”, organizada pelo CNJ. Em “Injustiças procedimentais: repensando a relação entre dados pessoais e reconhecimento fotográfico”, apresenta-se a metodologia da pesquisa e dados coletados para indicar como o planejamento do ciclo de vida dos dados, no caso, das imagens de suspeitos, precisa definir fontes lícitas para obtenção das imagens, formas seguras de armazenamento, definição de acessos e compartilhamentos, bem como o descarte desses dados.

A Minuta de Resolução proposta ao CNJ indica uma série de procedimentos obrigatórios para a validação do reconhecimento de pessoas enquanto prova, indicando em seu art. 8º, §2º, “a não ocorrência de apresentação sugestiva, entendida esta como um conjunto de fotografias ou imagens que se refiram somente a pessoas investigadas ou processadas, integrantes de álbuns de suspeitos, extraídas de redes sociais ou de qualquer outro meio.”

A proposta avança no que tange à limitação de expor imagens de álbuns de suspeitos e redes sociais, mas não trabalha conceitos da Lei Geral de Proteção de Dados ou mesmo o direito fundamental à proteção de dados (Constituição Federal, artigo 5º, LXXIX). Nesse sentido, é importante avançar no debate sobre o tratamento de dados pessoais na segurança pública e investigações criminais, evitando operações arbitrárias em sede policial ao redor do país.

A Resolução é importante desenvolvimento na contenção de injustiças sistemáticas que envolvem tratamento de dados pessoais no Brasil. Há inúmeros casos, envolvendo especialmente pessoas pretas e pardas, de prisões ilegais e injustas, envolvendo retenção de fotografias em catálogos de suspeitos, envolvendo até mesmo compartilhamento de fotografias entre policiais e vítimas por meio de Whatsapp. O país ainda precisa avançar em uma legislação específica para proteção de dados pessoais na segurança pública, algo que esperamos que possa avançar em 2023.

A Associação Data Privacy Brasil de Pesquisa atua em diversas frentes para que o uso de tecnologias de comunicação e informação sejam condizentes com direitos fundamentais e promoção de justiça social. Uma Nota Técnica sobre o anteprojeto de lei da LGPD Penal foi publicada em 2020, indicando caminhos importantes para maior aderência aos princípios da proteção de dados.