Tabuleiro #117 | Proteger crianças da exploração digital exige aprovar o PL 2628/2022 com coerência
No Tabuleiro realizamos uma curadoria semanal com o que há de mais atual e relevante no campo da proteção de dados. Confira a edição desta semana!
Olá!
No Tabuleiro de hoje:
- Lula assina decreto que determina uso de biometria para acesso a benefícios sociais
- AGU usa decisão do STF sobre Marco Civil para remover fraudes com IA e PIX no Facebook
- OpenAI e Reino Unido assinam novo acordo de IA para ampliar segurança e infraestrutura
- E muito mais!
- EDITORIAL
Proteger crianças da exploração digital exige aprovar o PL 2628/2022 com coerência
Por: Eduardo Mendonça e Rafael A. F. Zanatta
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O Projeto de Lei nº 2628/2022, atualmente em tramitação na Câmara dos Deputados, propõe regras específicas para o tratamento de dados pessoais de crianças e adolescentes. Entre as principais medidas estão a proibição do perfilamento comportamental e da publicidade direcionada com fins comerciais. Fundamentado no princípio do melhor interesse da criança, o projeto busca responder aos riscos da exploração algorítmica e da mercantilização da infância no digital.
A proposta dialoga com recomendações internacionais, como as do Comitê dos Direitos da Criança da ONU, e com diretrizes nacionais já estabelecidas por órgãos como o Conanda (veja nossas contribuições ao Conanda aqui), que reconhecem a necessidade de impor limites claros ao uso de dados de crianças no ambiente digital.
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A regulação do ecossistema digital é urgente para garantir a proteção integral de crianças e adolescentes, considerando que a Constituição Federal define que a proteção de seus direitos é “absoluta prioridade” (Art. 227, CF). O uso de dados pessoais para perfilamento e publicidade afeta diretamente seu desenvolvimento emocional, cognitivo e social, interferindo na construção da autonomia e identidade. Essas práticas exploram a hipervulnerabilidade infantil, já reconhecida pelo Conanda, pela LGPD e pela ONU.
A Resolução nº 245/2014 do Conanda proíbe o uso comercial de dados de crianças, e o PL 2628/2022 consolida esse entendimento em normativa federal. Evitar brechas que flexibilizam essas vedações é essencial para garantir coerência normativa e efetividade regulatória. Em um país marcado por desigualdades socioeconômicas e raciais, a ausência de regulação amplifica vulnerabilidades, penalizando ainda mais crianças em contextos periféricos, cujos dados são frequentemente coletados sem mediação crítica, consentimento real ou controle dos responsáveis.
A experiência brasileira mostra que essas violações são sistemáticas, como revelam casos envolvendo plataformas educacionais. Mesmo em contextos escolares, dados infantis têm sido explorados comercialmente de forma silenciosa e recorrente.
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A Data Privacy Brasil defende que o melhor interesse da criança deve orientar desde a concepção de produtos digitais. A proibição do perfilamento com fins comerciais é a única medida compatível com a Constituição, o ECA, a LGPD e o acúmulo técnico existente. Essa posição se ancora no princípio da precaução, amplamente reconhecido em contextos de inovação tecnológica com potenciais impactos irreversíveis sobre direitos fundamentais, especialmente quando afetam sujeitos em desenvolvimento. Nossa posição foi detalhada em audiência pública sobre o tema, em apresentação de Mariana Rielli.
Também entendemos que a legislação federal não pode adotar o conceito de “imperativo de consumo” proposto por alguns deputados em emendas ao PL 2628/2022, com base nas normas do CONAR, para qualificar o conceito de publicidade abusiva para crianças. Toda exploração comercial de crianças é ilícita. A comunicação de políticas públicas não se confunde com a publicidade de teor comercial, com vistas a ganhos econômicos com produtos e serviços em plataformas.
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Com a rejeição do regime de urgência, o PL 2628/2022 será retomado após o recesso parlamentar, no fim de agosto. Acompanhamos os desdobramentos com atenção, diante de propostas que buscam alterar dispositivos centrais.
A coerente interpretação do sistema de direitos das crianças implica em vedar a criação de perfis comportamentais de crianças, incluindo o uso de dados grupais e coletivos. Dizer que a publicidade com base em perfis comportamentais só se torna vedada quando tem o “objetivo de dirigir apelo imperativo de consumo” é confrontar o sistema ONU, a ECA e o CDC.
Seguiremos contribuindo com base técnica e diálogo institucional para fortalecer uma regulação coerente, eficaz e alinhada à proteção da infância.
• OBSERVATÓRIO
+ Lula assina decreto que determina uso de biometria para acesso a benefícios sociais
Na última quarta-feira (23), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou um decreto que estabelece as regras para o uso de biometria para concessão, renovação e manutenção de benefícios da seguridade social. Entre os benefícios estão o Benefício de Prestação Continuada (BPC), Bolsa Família, previdência, auxílios do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). O uso da biometria foi uma determinação estabelecida em lei, aprovada pelo Congresso no fim do ano passado, a partir de uma proposta enviada pelo próprio governo. (G1)
+ AGU usa decisão do STF sobre Marco Civil para remover fraudes com IA e PIX no Facebook
Após notificação da Advocacia Geral da União, o Facebook removeu uma série de postagens fraudulentas que usavam inteligência artificial para disseminar informações falsas sobre o Pix. A notificação foi feita com base na interpretação do Supremo Tribunal Federal sobre o Marco Civil da Internet. Os vídeos manipulados mostravam supostas “usuárias” reagindo a falas adulteradas do presidente e do diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central (BC) induzindo espectadores a acreditar em um suposto “direito a compensação financeira” para usuários do sistema de pagamentos. O golpe buscava direcionar vítimas a um site malicioso para coleta ilegal de informações pessoais. As publicações foram removidas na terça-feira (22). (Convergência Digital)
+ OpenAI e Reino Unido assinam novo acordo de IA para ampliar segurança e infraestrutura
Na última segunda-feira (21), o Reino Unido assinou uma “parceria estratégica” com a OpenAI. O memorando de entendimento voluntário envolve o compromisso da OpenAI de “explorar” investimentos em infraestrutura de IA, como centros de dados, e contratar mais funcionários no Reino Unido, sem fornecer detalhes sobre o valor do investimento. Em contrapartida, o governo britânico se comprometeu a encontrar maneiras de adotar as tecnologias de IA da OpenAI em serviços públicos como Justiça, defesa e tecnologia educacional. Isso pode exigir o uso de dados de milhões de cidadãos britânicos para criar serviços digitais impulsionados por IA. (Folha de S. Paulo)
• DADOCRACIA
Ep. 180- Música e IA: Artistas fantasmas e hits de mentira
No novo episódio do Dadocracia, convidamos Felipe Alves, do estúdio de pesquisa e comunicação 300noise, para falar sobre uso de IA para gerar músicas de fundo, sons genéricos que preenchem playlists de música ambient, jazz easy listening e trilha sonora de fundo para trabalhar e estudar. Ouça!
• DATA RECOMENDA
[Evento] 7 Anos de LGPD: Perspectivas para Governança de Dados e Inovação no Setor Público
Nesta terça-feira (29), às 11h, acontece a live “7 Anos de LGPD: Perspectivas para Governança de Dados e Inovação no Setor Público”, promovida pelo Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos. A palestra contará com a participação de Bruno Bioni, especialista em privacidade e proteção de dados e codiretor da Data Privacy Brasil. Nesta palestra, serão discutidos os aprendizados de 7 anos de aprovação da Lei Geral de Proteção de Dados, buscando trazer um histórico dos principais marcos e mudanças trazidas pela legislação nesses últimos 7 anos e, a partir disso, traçar perspectivas futuras. Assista!
[Artigo] CNJ define novas regras para a IA no Judiciário. O que mudou?
O Judiciário brasileiro tem novas regras para o uso de inteligência artificial. A Resolução nº 615/2025, recém-publicada pelo CNJ, substitui a antiga 332/2020 e redefine os limites do uso de algoritmos nos tribunais. O texto traz exigências mais rigorosas: mais transparência, auditorias periódicas, supervisão humana obrigatória e mecanismos para barrar discriminações. Mas o que está em jogo, afinal? E por que discutir essas mudanças exige olhar para as desigualdades estruturais e para a centralidade da dignidade humana? Confira o texto escrito por Eduardo Mendonça, pesquisador na Data, exclusivo aos membros premium do Clube Data. Se você ainda não possui uma assinatura premium, ative já usando o cupom TABULEIRO e tenha 10% de desconto no plano. Leia!
[Evento] Seminário Internacional: Inteligência Artificial em Perspectiva
O IDP realiza, com apoio do Centro de Direito, Internet e Sociedade – CEDIS e do Centro de Estudos Peter Häberle, evento que reunirá especialistas, autoridades e acadêmicos para discutir os rumos da inteligência artificial a partir de uma perspectiva crítica e interdisciplinar. O seminário será dividido em dois painéis temáticos e contará com a mediação de Laura Schertel Mendes e Fabrício da Mota Alves. Bruno Bioni, codiretor da Data Privacy Brasil, estará presente no painel “Soberania Digital: Fomento e Regulação da Inteligência Artificial no Brasil”. O evento acontece presencialmente em Brasília no dia 31 de julho. Inscreva-se!
• DICA CULTURAL
O Perigo De Estar Lúcida
Livro
“Com base na sua experiência pessoal e na leitura de inúmeros livros sobre psicologia e literatura, nesta obra a escritora Rosa Montero discute de uma forma única as ligações entre criatividade e instabilidade mental. Ensaio e ficção andam de mãos dadas nessa exploração das conexões entre o criar e a loucura. E para quem já acompanha ou quer conhecer mais sobre a autora, Rosa estará na Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), que acontece entre os dias 30 de julho a 03 de agosto”.
Dica de Alicia Lobato, assessora de imprensa e mobilização da Data Privacy Brasil.
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