A transformação da ANPD: de Autoridade à Agência Nacional de Proteção de Dados
A ANPD encontra-se em um momento decisivo de consolidação institucional, marcado por mudanças normativas e estruturais que reforçam sua posição como órgão regulador central no ecossistema de proteção de dados brasileiro.
A ANPD encontra-se em um momento decisivo de consolidação institucional, marcado por mudanças normativas e estruturais que reforçam sua posição como órgão regulador central no ecossistema de proteção de dados brasileiro. A transformação da ANPD em autarquia de natureza especial, prevista pela Medida Provisória nº 1.317/2025, assegura-lhe autonomia administrativa e financeira, passo que se alinha à trajetória de fortalecimento de sua independência decisória e operacional.
Autonomia administrativa e financeira: um requisito de independência
A MP nº 1.317/2025 alterou o Decreto nº 10.474/2020, que originalmente estruturava a ANPD como órgão da Presidência da República, e promoveu sua elevação ao status de autarquia de natureza especial. Essa medida garante maior previsibilidade orçamentária e autonomia na gestão administrativa, fatores essenciais para evitar ingerência política e assegurar estabilidade institucional. A previsão é que a transformação seja consolidada no decorrer de 2025, a depender da tramitação legislativa no Congresso Nacional. Atualmente, a MP aguarda apreciação na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, com pareceres favoráveis das comissões de Ciência e Tecnologia e de Constituição e Justiça.
As novas carreiras
O Estatuto Digital da Criança e do Adolescente (Lei nº 15.211/2025) representou um marco regulatório ao ampliar as competências da ANPD na proteção de crianças e adolescentes no ambiente digital. Com o ECA Digital, a ANPD se fortalece como agência de proteção de direitos.
A MP de 2025 conferiu novas atribuições de fiscalização e normatização, como também formalizou a criação de carreiras e cargos específicos para a Autoridade. Entre as novidades, destaca-se a autorização para a contratação de servidores de carreira próprios, rompendo a dependência exclusiva de cargos comissionados e cessões de outros órgãos. A norma modificou a lei federal de 2008 que institui o sistema de desenvolvimento de carreiras públicas e incluiu o cargo de “Especialista em Regulação de Proteção de Dados”, integrante da carreira de Regulação e Fiscalização da Proteção de Dados.
Em julho de 2025, a ANPD publicou edital para a realização de processo seletivo destinado à contratação de mais de 200 servidores, incluindo analistas e técnicos especializados em regulação de proteção de dados. Esse movimento é fundamental para o fortalecimento da capacidade técnica e para a constituição de um corpo permanente e profissionalizado.
A diferença da MP de Lula é a formalização de 200 novos servidores de carreira em Especialista em Regulação de Proteção de Dados, além de novos 18 cargos em comissão.
Inserção na cultura regulatória brasileira
A formalização da ANPD como agência nacional segue os parâmetros estabelecidos pela Lei nº 13.848/2019 (Lei das Agências Reguladoras), que dispõe sobre governança, autonomia e mecanismos de controle social aplicáveis a órgãos de regulação no Brasil. Pareceres recentes emitidos pela Comissão de Transparência e Governança do Senado reforçam que a adequação da ANPD a esse modelo institucional contribui para a previsibilidade regulatória, para a estabilidade decisória e para a redução de riscos de interferência política.
Maior enforcement e respostas mais efetivas
O fortalecimento institucional e normativo da ANPD terá efeitos diretos na aplicação da Lei Geral de Proteção de Dados (Lei nº 13.709/2018). Com autonomia administrativa, estrutura própria de servidores e maior estabilidade institucional, a Autoridade ampliará sua capacidade de enforcement, aplicando sanções de forma mais efetiva, promovendo orientações técnicas de maior qualidade e acelerando respostas a incidentes de segurança.
Além disso, o novo status da ANPD reforça seu papel em foros internacionais de proteção de dados e em discussões emergentes, como a regulação da inteligência artificial (em debate no PL nº 2.338/2023). Pareceres da Comissão Temporária de Inteligência Artificial do Senado e da Comissão de Ciência e Tecnologia da Câmara já apontaram a ANPD como candidata natural a coordenar o Sistema Nacional de Regulação e Governança de IA, função que exigirá maior robustez institucional.
Próximos passos
O cronograma legislativo prevê que a Medida Provisória nº 1.317/2025 seja votada até o final de outubro de 2025, sob pena de perder a validade. Caso seja aprovada pela Câmara e pelo Senado, seguirá para sanção presidencial, consolidando a transformação da ANPD em autarquia de natureza especial e garantindo a implementação integral de sua nova estrutura administrativa. Paralelamente, o processo seletivo de servidores deverá ser concluído no primeiro semestre de 2026, com a posse dos novos quadros técnicos. Esses dois movimentos combinados sinalizam uma consolidação institucional que permitirá à ANPD operar em condições equivalentes às principais autoridades de proteção de dados no cenário internacional.
Em síntese, o processo em curso, parte já vigente com a MP nº 1.317/2025 e parte ainda dependente de deliberação legislativa, consolida a ANPD como uma agência reguladora plena. Esse movimento garante ao Brasil uma agência com maior capacidade de aplicação das normas, mais resiliência institucional e melhores condições para proteger os direitos fundamentais dos titulares de dados e responder às demandas da sociedade digital.
A Data Privacy Brasil, que trabalha desde 2018 para a existência de uma autoridade de aplicação dos direitos dos titulares de dados pessoais, celebra este momento como uma importante vitória republicana e do Estado brasileiro.
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