No dia 9 de outubro de 2025, a 9ª Vara Federal Ambiental e Agrária da Justiça Federal do Pará protelou uma sentença importante articulando a Lei Geral de Proteção de Dados e Lei de Acesso à Informação.

Trata-se de Ação Civil Pública (Processo nº 1013342-35.2020.4.01.3900) protocolada pelo Ministério Público Federal (MPF) em 2020 em face da Agência Estadual de Defesa Agropecuária do Estado do Pará (Adepará). Nela, o MPF requer medidas de transparência ativa referentes às Guias de Trânsito Animal (GTA).

Criadas pela  Lei nº 8.171, de 17 de janeiro de 1991, as GTAs são documentos necessários para transporte de animais no Brasil. Sua finalidade é de controle sanitário, garantindo o aperfeiçoamento do controle de sanidade do animal e da qualidade do produto, sendo um instrumento de saúde pública.

Ainda assim, um possível uso secundário de dados é o controle ambiental, já que a pecuária é a principal forma de uso do solo de áreas desmatadas de Florestas Públicas Não Destinadas da Amazônia (Froehlich et. al, 2022, p. 16). Assim, o tratamento de dados pessoais para rastreabilidade da cadeia de carne bovina tem potencial para garantir a proteção ambiental a partir do controle da indústria.

A Data Privacy Brasil produziu em 2023 o relatório Datificação da carne: a imprescindibilidade de dados pessoais para rastreabilidade, monitoramento e responsabilização da cadeia produtiva da carne no Brasil, demonstrando a compatibilidade da transparência de dados pessoais da GTA para a finalidade de proteção ambiental. Demonstramos que o interesse público pela publicação de dados se sobrepõe à privacidade de proprietários desses animais, sendo fundamental para maior eficiência de políticas ambientais.

O MPF pleiteou interpretação similar na ACP, motivada pelo projeto Transparência das Informações Ambientais. Trata-se de iniciativa que busca garantir o acesso da sociedade civil às informações, procedimentos e decisões dos órgãos federais e estaduais que atuam em questões socioambientais em todo o território nacional – sendo a GTA uma delas. 

Apesar do requerimento do MPF, a Adepará não atendeu às solicitações, culminando no ajuizamento da ação. Dentre os pedidos estão a disponibilização de dados da GTA em listagem e documentos completos contendo Número da GA, data de emissão, volume transportado, procedência (CPF, CNPJ, nome, estabelecimento, município); destino (CPF/CNPJ, nome, estabelecimento, município), idade, finalidade, unidade expedidora, observações eventuais.

O juízo de primeira instância julgou procedente os pedidos, apontando não apenas a harmonia normativa entre Lei de Acesso à Informação e Lei Geral de Proteção de Dados, como também o reforço de que tal divulgação não fere qualquer tipo de direito à privacidade ou intimidade de proprietários de animais:

“A alegação de que as informações constantes nas GTAs se enquadrariam como ‘dados pessoais sensíveis’ não se sustenta. Os dados requeridos (número da guia, data, volume transportado, procedência e destino, CPF/CNPJ, município, finalidade, idade, unidade expedidora e observações) referem-se à atividade regulada, fiscalizada e licenciada pelo poder público, e são de interesse ambiental coletivo.” (9ª Vara Federal Ambiental e Agrária, JF/PA)

Na pesquisa realizada pela Data Privacy Brasil identificamos que, apesar do discurso de que os dados da GTA seriam sigilosos, em diferentes estados há compartilhamento com diversos órgãos, inclusive sem instrumentos formais disponíveis em portais da transparência.

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