Na terceira entrevista para a nossa série especial “Diálogos COP30: direitos digitais e justiça climática”, conversamos com Luisa da Silva, engenheira florestal, jovem ativista climática e defensora dos direitos digitais. Luisa é Alumni do Programa Youth do Comitê Gestor da Internet no Brasil e atua como assistente técnica no Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB), contribuindo com iniciativas socioambientais e políticas públicas voltadas à sustentabilidade com povos e comunidades tradicionais e inclusão digital.

Durante a entrevista, Luisa destaca temas como infraestrutura tecnológica, desinformação digital, conectividade, governança da internet e a proteção de dados e de comunidades tradicionais.

Confira a entrevista na íntegra e continue acompanhando nossos canais para conferir as próximas conversas dessa série especial.

 

Data: Quais você considera os principais temas de interação entre direitos digitais e direitos ambientais?

Luisa: Essa é uma ótima questão, porque muitas vezes as pessoas entendem os assuntos como debates separados, mas na verdade há várias questões importantes e várias intersecções. Comecei a atuar na área de Governança da Internet fazendo parte do projeto Plantaformas, da Casa Preta Amazônia. A época, a organização fazia vários espaços sobre Meio Ambiente e como a revolução técnico-científica afetava a Amazônia a partir de como se posiciona o Brasil e a Pan Amazônia na Divisão Internacional do Trabalho isso gerava uma reflexão sobre como as redes sociais, como a infraestrutura tecnológica, como o colonialismo de dados, como a desinformação digital afetam o território e as pessoas que vivem nele a partir das disputas por recursos naturais, principalmente na questão mineral. 

São muitas intersecções que quando começamos a analisar, percebemos o quanto não é tão óbvio para olhares desatentos. Mas dentre as que apontei creio que estão sejam algumas das principais, bem como a proteção de dados de comunidades tradicionais e dados genéticos da biodiversidade, que pode se tornar um grande problema a longo prazo, devido a exploração que a agricultura e a silvicultura de precisão tem realizado em diversas partes do mundo.

 

Data: Qual a relevância de profissionais especializados em proteção ambiental trabalharem em conjunto com profissionais da área dos direitos digitais? Como você observa que as áreas podem se ajudar?

Luisa: Acredito que há vários cenários possíveis. No setor em que eu trabalho, com sociobiodiversidade, uma das grandes preocupações é sobre a segurança informacional dos territórios (quais são os recursos que eles tem, se podem ser especulados por grandes corporações e empresas de fora com o poder para tirá-los do território e usufruir dos seus recursos, sejam eles biológicos ou minerais), mas também e principalmente, sobre a conectividade das comunidades para o desenvolvimento. Como se conectar com o resto do mundo sem perder as essências da comunidade, como se conectar para ter acesso a mais serviços e direitos, como educação, saúde e empregabilidade. Como usar a internet como ferramenta de denúncia, para que se lembrem dessas pessoas quando o Estado por muitas vezes esqueceu delas. Ter profissionais trabalhando esses temas juntos para que as pessoas se conectem de forma segura e que consigam compreender quais são esses desafios atuais, faz com que possamos criar territórios mais resilientes por meio das pessoas.

 

Data: Na sua opinião, a COP30 será um espaço privilegiado para esses debates?

Luisa: Será e por vários motivos. A COP de Belém está sofrendo com a especulação imobiliária, então nem todo mundo conseguirá um lugar com preço justo para ficar e isso já exclui muita gente de diversas partes do mundo. Para além disso, as COPs em si já são espaços privilegiados, porque são conferências feitas para as Partes, para os países. Só lá por 2005, que as COPs foram abertas para a sociedade, mas não é qualquer um que consegue influenciar na Blue Zone, até porque cada ano que passa as credenciais estão sendo reduzidas. Então há muitos recortes que precisam ser avaliados, mas essa COP está sendo de diversos desafios e esses são alguns deles.

 

Data: Quais devem ser as prioridades da sociedade civil para atuação com

pesquisa e incidência?

Luisa: Já são algumas COPs que estão lutando para um financiamento climático justo. Baku foi um fracasso comparando com o que se esperava, há muita gente depositando esperanças na COP de Belém. Acredito que a sociedade civil por vezes não entende o caminho do financiamento climático, por onde vem, por onde vai e acaba sendo extremamente limitada para acessar os caminhos que já são escassos, mesmo que já exista um pouco de esforço para o entendimento do tema. Então acredito que é preciso priorizar esse tema, bem como também a linha de Mitigação e Adaptação Climática, já que estamos nos encaminhando para Ebulição Climática. Avaliando os últimos relatórios do IPCC e também após participar de uma recente conferência sobre o tema – a Conferência Internacional sobre Adaptação Baseada na Comunidade (CBA 19) – percebo o quanto estamos atrasados em nos encaminhar sobre esse tema também que a partir de agora vai ser nosso futuro.

 

Data: Como você tem visto os principais desafios no avanço das discussões

sobre os direitos digitais e ambientais?

Luisa: A Governança da Internet precisa pesquisar de forma mais profunda seus impactos no meio ambiente, de forma direta e indireta e isso ainda é muito ignorado. Os focos estão ultra voltados para IA e temas similares e isso acaba restringindo um tanto a nossa visão e limitando os debates a “simples” questões sobre impactos sociais quanto às redes sociais, quando há muito mais que isso. Precisamos avançar com soluções compartilhadas sobre as discussões existentes.

 

Data: Quais suas expectativas para a COP30 em relação às movimentações que tem acontecido da sociedade civil? Você acha que vai ser um espaço mais aberto ao diálogo e mais resolutivo?

Luisa: Acho que só o fato de não ser em um deserto financiado pelo petróleo já ajuda bastante, mas para além das limitações que citei sobre a COP de Belém, a parte positiva é que a COP vai tomar a cidade para além das grades do Parque da Cidade (área prevista para ocorrer o evento), então vai acontecer nas periferias, nas ilhas, nas cidades da região metropolitana que são invisibilizadas e isso vai tornar o diálogo mais aberto e isso vai levar pressões aos países a fazerem metas mais ambiciosas e necessárias. Mas Bonn deu um pouco da linha de como vai ser Belém, o que esperamos é que seja mais resolutivo que na Alemanha.

 

Data: Que tipos de acordos você acredita que são esperados de ocorrer?

Luisa: Minha maior preocupação é quanto às novas NDCs (Contribuições Nacionalmente Determinadas) e acordos sobre financiamento climático. Ano após ano esperamos que os países ricos poluidores paguem mais, mas sempre se esquivam. Além disso, esperamos, e falo como ativista climática, um Fundo de Perdas e Danos, voltado a países vulneráveis que já sofrem impactos climáticos, principalmente voltado ao Sul Global.

 

Data: Como você tem visto a relação entre justiça climática e tecnologias

digitais?

Luisa: A relação entre justiça climática e tecnologias digitais é marcada por contradições e similaridades: ao mesmo tempo em que as tecnologias oferecem ferramentas poderosas para monitoramento ambiental, mobilização social e gestão comunitária de territórios, elas também podem aprofundar desigualdades quando desenvolvidas sem considerar contextos locais, culturais e socioeconômicos. Então são temas que coexistem e deveriam colaborar mais, sabe? São temas que coexistem junto para a justiça social e por vezes a falta de um corrobora para a falta do outro.

 

Sobre Luisa da Silva 

Engenheira florestal, jovem ativista climática e defensora dos direitos digitais. Alumni da Embaixada Americana e do Programa Youth do Comitê Gestor da Internet no Brasil. Atua como assistente técnica no Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB), contribuindo com iniciativas socioambientais e políticas públicas voltadas à sustentabilidade com povos e comunidades tradicionais e inclusão digital.

 

Sobre a série “Diálogos COP30: direitos digitais e justiça climática”

A nova série especial da Data Privacy Brasil tem o objetivo de ouvir vozes diversas sobre a interface entre a agenda climática e os direitos digitais. O novo projeto surge em um ano único: a realização da primeira Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP30) no Brasil, que está prevista para ocorrer entre os dias 10 e 21 de novembro de 2025 na cidade de Belém – Pará. As entrevistas acontecem no âmbito da área de “Assimetrias e Poder” da Data e terão a participação de uma multiplicidade de especialistas no tema.

Veja também

Veja Também