Em uma decisão judicial histórica, uma corte federal estadunidense na Califórnia determinou nesta segunda-feira (6) que a empresa israelense NSO Group deverá pagar cerca de US$ 170 milhões à Meta por ter conduzido um ataque massivo de espionagem contra cerca de 1400 usuários do aplicativo de mensagens da empresa, o Whatsapp, em 2019, por meio do conhecido spyware Pegasus.

A sentença trata-se da primeira grande derrota judicial de uma empresa de spyware em um tribunal dos Estados Unidos, estabelecendo um precedente internacional na responsabilização por abusos cometidos com tecnologias de vigilância.

O ataque operado pelo NSO Group explorou uma falha no sistema de chamadas de vídeo do Whatsapp. Mesmo que as chamadas não fossem atendidas, o simples toque era suficiente para instalar o Pegasus secretamente no aparelho da vítima. O software permite acesso completo ao dispositivo com escuta às conversas, acesso a arquivos, ativação do microfone e câmera remotamente, além de monitorar toda a atividade digital do alvo.

Entre as vítimas identificadas, estavam jornalistas, defensores de direitos humanos, membros da sociedade civil e diplomatas de diversos países — exatamente os grupos de risco que deveriam estar protegidos contra esse tipo de intrusão por compromissos internacionais de direitos humanos e manutenção do estado democrático de direito.

Em resposta à condenação, a Meta anunciou que pedirá uma ordem judicial permanente para impedir futuras ações semelhantes por parte do NSO Group e que destinará parte da indenização recebida a organizações que defendem os direitos digitais.

Apesar da decisão contundente, a NSO Group já declarou que irá recorrer da sentença, sustentando que vende suas ferramentas exclusivamente a governos com objetivos de segurança nacional — um argumento repetidamente contestado por evidências de uso abusivo de seus produtos contra vozes críticas e opositoras de regimes autoritários e até mesmo democráticos.

A vitória é simbólica, mas ainda há um longo caminho.

Esta decisão escancara a urgência de uma mobilização coordenada da sociedade civil global diante da crescente normalização da vigilância digital como ferramenta de repressão e controle social. O demonstra como tecnologias extremamente invasivas continuam sendo comercializadas em um mercado opaco, sem controle público efetivo, nem mecanismos mínimos de regulação, transparência e responsabilização, desrespeitando direitos fundamentais e minando as estruturas basilares do estado democrático de direito.

Frente a esse cenário, organizações de direitos humanos, jornalistas, acadêmicos e técnicos têm um papel central na criação de protocolos de defesa, na produção de conhecimento científico, técnico e jurídico, além da pressão por legislações que impeçam a disseminação e o uso abusivo dessas ferramentas.

Mais do que nunca, é preciso denunciar publicamente os riscos da vigilância descontrolada, articular campanhas por proibições de tecnologias abusivas, como os spywares e os sistemas de reconhecimento facial, e exigir que governos atuem com firmeza na garantia dos direitos fundamentais na era digital. 

A decisão contra o NSP Group não encerra a ameaça. A luta contra o tecnoautoritarismo, contra a vigilância abusiva é, também, uma luta em defesa da liberdade, da privacidade e da própria democracia. E a Data Privacy Brasil continua com o compromisso em combater as assimetrias existentes em nossa sociedade.

Confira mais informações na nossa página do Projeto Iniciativa de Defesa Digital e Malhas Digitais.

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