No dia 6 de dezembro, um primer sobre fragmentação da Internet e cibersegurança foi publicado através do Instituto das Nações Unidas para Pesquisa sobre o Desarmamento (UNIDIR). De autoria de Samuele Dominioni, pesquisador do programa de Segurança e Tecnologia do instituto, o documento surge como primeiro resultado de um estudo em duas partes sobre os tópicos em questão que vem sendo conduzido pelos pesquisadores do programa.

O documento foi construído através da revisão de materiais disponibilizados ao público, entrevistas com especialistas e diálogos multissetoriais realizados em um evento online sobre o tema. O intuito do texto é apresentar um panorama introdutório dos desenvolvimentos e discussões relacionados à fragmentação da Internet.

Através da inspiração expressa no white paper sobre fragmentação da Internet do Fórum Econômico Mundial (FEM), de 2016, o documento da UNIDIR abrange a definição de fragmentação da Internet, enfatizando a fragmentação técnica. Também explora áreas de preocupação que ela representa na camada técnica, utilizando a mesma divisão delineada pelo documento do FEM, ou seja, os riscos são observados nas áreas de endereçamento, nomenclatura e roteamento (“addressing”, “naming”, and “routing”). Além disso, o texto aborda a problemática da fragmentação da Internet na área de cibersegurança através dessas mesmas áreas de risco.

No âmbito da Data Privacy Brasil, temos desenvolvido um projeto especificamente voltado à fragmentação da Internet e à soberania digital. Ao acompanhar as discussões sobre os temas de maneira próxima, observamos que o documento da UNIDIR foi recebido pela comunidade dedicada ao combate à fragmentação da Internet como um salto no debate, no sentido que essas discussões estão sendo gradualmente introduzidas em espaços da ONU, ainda que indiretamente, como é o caso do Open-Ended Working Group on Security of and in the use of Information and Communications Technologies, e o Ad Hoc Committee to Elaborate a Comprehensive International Convention on Countering the Use of Information and Communications Technologies for Criminal Purposes, ambas as iniciativas propostas por Rússia e China.

Apesar desse salto qualitativo no debate sobre fragmentação da Internet que o documento representa, este tem aparecido em foros internacionais que fazem parte das policies arenas coordenadas pela Organização das Nações Unidas já há alguns anos, como a União Internacional de Telecomunicações (UIT) e o Internet Governance Forum (IGF). Neste último, vale destacar a criação da Policy Network on Internet Fragmentation (PNIF), que consiste em uma atividade intersessional – isto é, que é conduzida no período entre edições de um IGF.

A PNIF nasceu como uma iniciativa comunitária e com um arranjo multissetorial, composto por membros da sociedade civil, setor privado e comunidade técnica, para conscientizar sobre as medidas técnicas, legislativas, regulatórias e de governança que constituem um risco para a Internet aberta, interconectada e interoperável. A PNIF entende que existem diferentes formas pelas quais a fragmentação da Internet se manifesta, compreendendo desde questões técnicas, relativas à padronização e desenvolvimento de protocolos, até questões regulatórias, governamentais e relacionadas às diferentes experiências de usuário pelo mundo. Além destas, a PNIF aponta para a possibilidade de fragmentação da própria governança da Internet, a partir da criação de múltiplas arenas de discussão.

Nesse contexto, o debate sobre fragmentação da Internet é importante tendo em vista a principal característica da Internet: ser uma rede de redes globalmente conectada. Ou seja, discutir a fragmentação da Internet é discutir uma mudança no núcleo público – e duro – da rede. Há, também, neste debate, uma relação intrínseca com as discussões acerca da soberania digital. Isto é, existe uma oposição entre soberania digital e uma Internet única, globalmente conectada? Dentre outras, essa é uma das perguntas que orienta o projeto desenvolvido pela Data Privacy Brasil, e os debates mais amplos sobre fragmentação da Internet, que demonstram a transversalidade do tópico dentro das discussões sobre a Governança da Internet.

Sobre a UNIDIR

O Instituto das Nações Unidas para Pesquisa sobre o Desarmamento (UNIDIR) é uma instituição de pesquisa autônoma dentro do ecossistema da Organização das Nações Unidas (ONU). Estabelecido em 1980, os principais objetivos do UNIDIR envolvem oferecer suporte aos países-membros da ONU em tópicos relacionados à segurança internacional e ao desarmamento através da construção de conhecimento e pesquisa e da facilitação de diálogos diplomáticos e multissetoriais.

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